nº 33 ano 9 | Junho 2018
Resenha

Peixes e aquários; pessoas e cidades

a simbiótica relação entre habitantes e seus locais de moradia

Por Nathalia Assmann Gonçalves

O filme Aquarius retrata uma questão bastante latente nas grandes cidades atuais: a especulação imobiliária. O enredo se desenrola a partir de uma não aceitação de venda do apartamento de propriedade de Clara. A empresa compradora pretende destruir o prédio no qual a protagonista reside e construir um novo condomínio mais luxuoso no local. A personagem se vê em um embate bastante simbólico com a construtura que já havia comprado todas as unidades do edifício, só restando a de Clara, que se vê sozinha no prédio cobiçado.

Digo simbólico o embate, pois a negativa se baseia menos em uma questão monetária, já que a oferta é de um valor bem elevado, e mais em uma razão subjetiva de preservação de memória e apego afetivo ao ambiente. Nesse sentido, há uma evidente resistência à ideologia que reduz tudo e todos a um valor comercializável – isto é, abre margem a uma crítica à racionalidade mercadológica que atualmente se tornou regra nas grandes cidades. Esse embate fica bastante evidente, pois Clara pertence à classe média/alta, não necessitando de mais dinheiro para seguir sua vida já confortável no bairro de Boa Viagem em Recife. Nesse sentido, a protagonista não é seduzida por nenhuma quantia em dinheiro, devido sua condição social permitir essa escolha. Vale ressaltar que, caso a personagem e os habitantes desse prédio pertencessem a uma camada mais vulnerável e precária da sociedade, não haveria tanto diálogo como ocorreu no filme, conforme exemplos trágicos na história brasileira, em que famílias foram retiradas a base de força policial, mesmo quando preenchiam os requisitos de usucapião ou de concessão.

Entretanto, apesar de o filme não ter escolhido uma pessoa pertencente à camada social mais baixa não é perdida a credibilidade da crítica ao ganancioso mercado imobilário que não mede esforços para atingir os seus objetivos por mais lucro individual. Clara bravamente se utiliza de sua posição privilegiada para afirmar que o apartamento em questão não possui preço, mas sim um enorme valor sentimental.

Peixes e aquários; pessoas e cidades
Nathalia Assmann Gonçalves
ago.nathalia@gmail.com
é graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria. Mestranda em Direito pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro.