nº 21 ano 6 | Junho 2015
Resenha

A luta por um Brasil que quer pedalar mais e melhor

Por Juciano Martins Rodrigues

Em um país onde a frota de automóveis e motos vem crescendo dez vezes mais do que a população, é muito bem-vinda qualquer iniciativa que promova e difunda meios de locomoção mais sustentáveis e um trânsito mais humano. Sendo a iniciativa um livro feito por quem de fato veste a camisa do cicloativismo no Brasil é ainda mais louvável.

Vivemos em um país onde ciclistas, e da mesma maneira os pedestres, são historicamente ignorados nas suas demandas por deslocamento e raramente são alvos das políticas públicas de transporte.

Publicado pelas organizações Aliança Bike, União dos Ciclistas do Brasil, Bicicleta para Todos e Bike Anjo, A bicicleta no Brasil – 2015 é uma reunião de vozes em forma de livro. Vozes que clamam por opções que possam ir além das tradicionais soluções para o trânsito e o transporte, que sempre privilegiaram a circulação do automóvel sem considerar seus enormes custos sociais.

O livro reúne duas contribuições principais, que são essenciais para o debate sobre a inclusão da bicicleta como meio de transporte, principalmente em grandes cidades.

Em primeiro lugar, o livro contribui com o que se poderia considerar um balanço da política cicloviária no país e com o resultado de tal política (ou de sua ausência) em dez capitais: Aracaju (SE), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Fortaleza (CE), Manaus (AM), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). Revelados os dados sintéticos apresentados para cada cidade, não se tem muito o que comemorar, apesar de avanços importantes, como aqueles que têm ocorrido em São Paulo. Há muito a fazer. A começar pela solução do enorme descompasso entre o que está previsto em lei e o que de fato tem sido executado em termos de política cicloviária. Mas não é só isso. A visão dos autores é que “a bicicleta, com tantos benefícios inatos que carrega, deve transcender os papéis e leis, os discursos, a euforia e os modismos, para assumir um papel de maior destaque no dia a dia das estruturas de poder” (p. 18).

Além disso, em segundo lugar, por ser um produto do esforço de “ciclistas organizados”, como, em certo momento, eles se autodenominam, pode se interpretar que o livro também reflete o estado do cicloativismo no Brasil. Assim, pode ser considerado o cartão de visita de uma parcela da sociedade civil organizada à qual se deve boa parte dos avanços alcançados até o momento. Agora, esses mesmo “indivíduos conectados apenas por ideais” (p.8) proporcionam, para os leitores, 65 páginas de resultados de sua militância e de desafios a serem enfrentados.

A bicicleta no Brasil – 2015 é, acima de tudo, o produto do esforço coletivo para produzir conhecimento sobre o uso da bicicleta, mas não só isso, é, ao mesmo tempo, inspiração e agenda para a luta por cidades mais justas e mais humanas. O livro explicita muito bem os sentidos dessa luta e, por isso, constitui um marco para o cicloativismo no país.

Por sua concepção e o seu cuidado conceitual, o livro também colabora com as reflexões acadêmicas sobre o uso da bicicleta nas grandes cidades brasileiras e, além disso, reúne informações e ideias que podem muito bem ser incorporadas no processo de planejamento.

Estamos, portanto, diante de uma obra que empodera a sociedade para discutir seriamente novos caminhos para a mobilidade urbana. Afinal, já passou da hora de a política cicloviária ser levada à sério no Brasil.

Se a bicicleta é o meio de transporte mais silencioso, muito barulho ainda há de ser feito por ela.

A luta por um Brasil que quer pedalar mais e melhor
Juciano Martins Rodrigues
é doutor em Urbanismo, pesquisador do Observatório das Metrópoles e pós-doutorando no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ).